segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

DE UM NORDESTINO PARA O RIO, EM JANEIRO

Rio,

Sinto por ti a mesma dor que senti pela Zona da Mata do meu Pernambuco e de Alagoas durante as chuvas de meados do ano passado aqui no Nordeste. Infelizmente, nossas forças para ajudar os irmãos de Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis são menores do que as que tínhamos para ajudar os de Barreiros, que estavam aqui tão próximos a nós, mas, mesmo assim, não descansamos. O Nordeste está solidário e estamos nos desdobrando para enviar recursos que minimizem o sofrimento dos nossos queridos irmãos fluminenses, filhos legítimos ou que adotaste com amor em teu solo, ó Rio. Sei que não era preciso dizer, mas não há qualquer ressentimento quanto àqueles que, há poucos meses, disseram que preferiam ver os Nordestinos mortos; há, sim, perdão e vontade de fazer diferente, pois Deus nos fez para a vida em plenitude e não para a morte. Nós somos brasileiros e humanos, náo é memo, Rio? E, por isso, tudo o que é relativo ao Brasil e à humanidade nos diz respeito e recebe de nós todos atenção e amor. Tu és Brasil e és humano, Rio! Recebe, pois, nossa atenção e nosso amor! Um amor muitas vezes ressequido, faminto, retirante, agreste, mas amor: ensolarado e vivo como tem de ser o amor! Não cremos, Rio amado, nos excessos da imprensa, não esperamos por uma política de má vontade, que não te ama, que não nos ama; cremos, sim, num Deus que, no princípio, pairava sobre a face das águas e para Quem nada é impossível, cremos que que Ele consola os que choram a dor das perdas irreparáveis e transforma o coração dos homens públicos e anônimos para que juntos façamos a vontade dEle, que é ver Seus filhos felizes. Esse Deus estava conosco na seca de 1915, nas cheias de 2010 e estará para sempre contigo, ó Rio, em todos os janeiros chuvosos! Ele nunca nos abandonará. Deus não está te castigando, ó Rio, está apenas derramando Suas águas sobre ti para lavar-te, renovar-te e deixar-te mais forte. É esta fé que nos põe solidários, fraternos, esperançosos e não menos indignados contra tudo o que coopera para que o sonho lindo desse Deus maravilhoso não ocorra. Em nome do estado de Pernambuco e do Deus de nossos pais, repudio a imprensa vendedora de tragédias e a política desumana da falta de vontade e rogo para que tu, Rio, sejas lavado por ondas de solidariedade, humanismo e fé. Que o Rio, neste janeiro, faça jus ao seu nome e renasça das águas, como num novo batismo. Viva ao Rio, em Janeiro e sempre!

Pernambucanamente,
 
--
Marcos de Andrade Filho
Cónsul de Poetas del Mundo en Ciudad de Recife - PE
Academia de Letras do Brasil - Brasília/DF
União Brasileira de Escritores - Secção Pernambuco

terça-feira, 3 de março de 2009

Prata da casa: "Calor humano"

Abraço porque querer abraçar.
Sentir a força dos braços quebrarem.
No aperto das almas.
No espelho cego.
Na fonte de água.
Na cor da nuvem.
Abraço para ter em braços.
A luz da cor.
A cor do desejo.
Abraço meus próprios braços.
Por falta de abraço a quem dá.


Raphael Franck

Prata da Casa: "A cor da flor que sangra"

Há sombra de você em flor.
E fechar e deixar-se calar.
Não há quem beijar sua pétala.
Flora.
Concorda em seu íntimo amar.
Quem nunca soube com você retribuir.
A sombra de um beijo negado.
Em íntimo amor renegado.
É estranho dizer a um ser não amado:
Dê-me sua pétala para me manter em você guardado.


Raphael Franck

domingo, 1 de março de 2009

Prata da Casa - "Una Canción"

Una Canción

(Para Rayssa Mesquita)

Voz de cães, latidos de homem… Era noite de chuva. Solidão e chuva. Só. Apenas a tristeza é aquática nesta terra sem litoral. Cansado de tanta janela, saí de casa com fome. Não sabia, no bem da verdade, se era de fato fome… Mas, se não fosse, era algo muito próximo de uma necessidade de mastigar o tempo, as vozes, os cães, os latidos, os homens, a noite, a chuva, a solidão, a chuva, o só, o apenas, a tristeza, o aquático, a terra, o sem, o litoral, o cansaço, as janelas, as saídas, as casas, a fome, o saber, o bem, a verdade, o fato, a fome… Saí debaixo de chuva, e tristeza, e solidão, e noite… Tem de galinha? Com coca-cola… zero, por favor! Comi. Comi de encher a boca, de estufar o estomago, mas não se foi a fome do aqui-dentro mais dentro que a boca do estômago…
Sentaram-se, diante de minha só figura satisfeita de fome, uma flauta e uma voz. Cresceu-me a fome, uma fome mais faminta que os esfomeados de sonho e dignidade. No meio de tanto som de chuva e de tanta comida inútil, uma flauta e uma voz tomaram os assentos a minha frente. Busquei outros barulhos, sons, chuvas, coisas a serem comidas como quem busca tapar os ouvidos… Abri a bolsa que levara comigo como quem rói unhas e apanhei o primeiro livro que minha mão tocou naquela misteriosa e escura caverna portátil. Um livro! Essa voz que tudo calará um dia, essa fome maior que a minha, esse alimento que transcende o pão, o corpo, a hóstia… um livro: “Veinte poemas de amor y una canción desesperada”. Até tu, Neruda? Eu aqui, cercado de planalto, fome, agora flauta e canção, e, como se não bastasse ser sem litoral e não ter lembrança de litoral diferente desta chuva pluvimedonha, me vens tu, poeta, me falar de amor, canção e desespero? Logo tu, que tens a te cercar os dois lados de mim mesmo: teus Andes, este planalto; teu Pacífico, meu litoral?…

“Fui solo como un túnel. De mí huían los pájaros
y en mí la noche entraba su invasión poderosa.
Para sobrevivirme te forjé como una arma,
como una flecha en mi arco, como una piedra en mi honda.

Pero cae la hora de la venganza, y te amo.”

Basta, Neruda! Por que não te deténs a ti, tu que devias aplacar minha fome e aplacas apenas meus ouvidos míopes e meus olhos já tão surdos? A flauta abriu uma pasta preta, dela saltaram folhas pautadas, pentagramas. E, como se o metal, o ar, o papel tivessem vida, nasceu de seus pulmões um sopro, vida, espírito, um sutil Mozart… era alto, com porte de homem sério, semibreve, ria pouco, tinha ar sereno: músico. Tocava Mozart. A voz lia a partitura atenta, a flauta tocava. Era uma voz vestida à espanhola, olhos amendoados, rosto geométrico, uma dama de Avignon, Carmen, cabelos negros, boca aguda, semicolcheia: soprano. Começou a dizer uma tímida Zerlina:
Vorrei, e non vorrei,
Mi trema un poco il cor
Felice, è vero, sarei,
Ma può burlami ancor.

Surpreso de tanto som, mal tive tempo de me deter surpreso de mim mesmo que cantarolava com ela em dueto:

Vieni, mio bel diletto!

Mi fa pietà Masetto.

Io cangierò tua sorte!

Presto non son più forte!
non son più forte!
non son più forte!

Vieni, vieni!

Là ci darem la ma… Ela olhou-me por debaixo dos olhos! Ele também, menos simpático que ela. Estanquei olhar e canto. Voltei a ler rápido:

“Cuerpo de mujer mía, persistiré en tu gracia”

Vorrei e non vorrei

“¡Mi sed, mi ansia sin limite, mi camino indeciso!”

Mi trema un poco il cor

“Oscuros canses donde la sed eterna sigue,
y la fatiga sigue, y el dolor infinito”

Não percebi de pronto que já chorava àquela altura. Não de desespero, mas como um menino faminto, numa viela suja e fria, que sente no palato o vapor de uma sopinha quente… Ao redor, ouvi som de água, mas não era da chuva… notei que todos se levantavam interessados em tanto som de mar nos cimos do planalto. A terra vermelha encantava-se de brancura e ficava cada vez mais alva e leve de voar com o vento. Dunas se formavam no horizonte. A noite amanhecia com sol de tarde. Era meio dia. As crianças corriam, pulavam n’água, chamavam seus pais para uma brincadeira na praia que trouxe o dia. Os cumes das colinas do planalto eram ilhas que todos podiam visitar. As ondas do pacífico oceano molhavam meus pés e o meu sal aquático foi se encontrar com o sal deste litoral que, agora, milagrosamente havia e era tudo ao meu redor e eu, todo litoral…
A flauta e a voz se despediram do medo em forma de gato que se aninhara em minha cadeira com medo da água e partiram com som de Mozart:

Andiam, andiam, mio bene
A ristorar le pene
D’un innocente amor…

e eu soube, naquele momento, que eu não estava só e não havia chuva no mundo se não houvesse som de chuva nas minhas janelas… eu estava apenas com fome – uma fome faminta mais profunda que minha boca e a boca do meu estomago… Neruda, en mis manos, llenas de sal, me decía, sin voz, de mi soledad (olvidada) y de mi amor (siempre conmigo):

“Me gustas quando callas porqué estás como ausente,
y me oyes de lejos, y mi voz no te toca”


Marcos de Andrade Filho
Brasília, 30 de dezembro de 2008.

Prata da Casa: Caosmos

Em vagões, metrôs, esquinas, bares, apartamentos, janelas... em qualquer lugar do passado, há 10 ou 100 anos atrás, ou agorinha mesmo, não tem nem 15 minutos! Tanto faz... tempo e espaço é o que menos importa nessas horas! Ela vem sorrateira quase rastejando. Possui a qualquer um, em qualquer lugar, seja quem for... é voluptuosa, embriagante; os olhos piscam só por necessidade, mas a vontade mesmo é de ficarem petrificados, semicerrados... a pupila quase que dilata quando num arroubo ela nos leva... não tem forma, porque forma é casca e ela é essência! Não é nirvana, porque ela não nos purga de sofrimento algum... é só um estado que pode durar frações de segundos ou uma eternidade... Enfim, não é nada não, só me conveio chamá-la de “ela” para ter como chamá-la; não é como a chuva que chove sozinha, sem ter um sujeito que a execute; ela precisava de um sujeito e eu a dei: Ela! Estava eu num desses instantes em que a gente sai do corpo, parecendo flutuar em algum lugar inóspito... Nesse instante ela já tinha chegado, mas eu não havia percebido, porque naquele momento eu não tinha consciência nem da minha própria existência. Foi assim que tudo começou... Bem, para se ter um referencial, digamos que eu estava numa dessas conduções que a gente toma todo dia, para fazer o que tem que ser feito, com hora marcada e local certo... tudo o que eu via rotineiramente com minha visão automatizada passou a ter um novo sentido. Meus olhos estavam envolvidos em lágrimas. Não por emoção! Mas por ofuscamento mesmo. Como se tivessem me retirado uma venda dos olhos, eu vi o mundo pela primeira vez... Tudo parecia ter sua forma original! Não era cópia de cópia! Era primordial, com cores muito nítidas e fortes, como se tivesse acabado de sair de uma película e tinha... Era muito para os meus olhos! Foi a primeira vez que eu enxerguei... Era como ser envolvida por um misto de medo e deslumbramento... E aquelas pessoas ao meu redor? Tudo muito estranho... derrepente elas não eram só “pessoas”; em cada fisionomia enxerguei medos, amarguras, lembranças, esperanças, sonhos. Era como um labirinto em forma de “gente”, cada um possuía diversas camadas que iam criando profundidade tridimensional... Não tinha fim, era tudo muito obscuro, inefável! Olhei a janela... Ah, a janela não é tridimensional como as pessoas, ela não tem profundidade, mas muito me foi útil. Por detrás da janela vi as imagens passando vagarosamente, árvores mudas, luzes elétricas como velas em procissão. Pó e escuridão. Pó e escuridão... Me perdi na escuridão e eu era pó também! Tudo era pó ao meu redor... Tive uma boa sensação, não carregava mais o peso do corpo, do embuço ou seja lá o que for. Eu simplesmente pairava sobre o ar, como quando nosso corpo flutua sobre a água. Olhei distraída para a janela e vi o reflexo das imagens distorcidas atrás de mim, como num espelho fantasmagórico, com meu invólucro ausente. Ao olhar fixamente aquela tela psicodélica, senti algo inenarrável, uma sensação de onipresença! Vi a junção das duas dimensões. Passado e futuro juntos. Eu o presente? Estávamos todos no mesmo barco, todos-um-só. Nada se dividia... Substância homogênea! Por um instante a janela foi a metáfora de uma vida, logo foi descartada, pois era só mais uma casca e dessas existem diversas, é só escolher. Olhei-a fixamente e comecei a imaginar as pinceladas do seu processo de criação, em alguns pontos da tela o pincel parecia já exaurido, em outros haviam buracos... não conseguia ver bem. Talvez fosse o futuro, e o futuro é incerto, como todos bem sabem! E o que é mesmo o futuro senão o presente que acabou de passar? O quadro não era obsoleto, nem uma obra de arte, porque as coisas não são melhores nem piores, elas apenas são. Finalmente olhei para o céu, ele parecia maior do que de costume... É como quando a gente cresce e volta em um lugar de quando éramos criança e temos a sensação de que o lugar era bem maior; nesse caso aconteceu exatamente o inverso! Ela já tinha ido embora subitamente... Não sei se naquele instante eu acordei, ou se eu estava acordada e agora durmo. Vi a luz das estrelas supostamente mortas; a luz só chegou muito depois... A melancolia diária bateu bem mais forte. E as coisas começaram a voltar aos seus devidos lugares. Passado e futuro. Céu e terra... Ainda havia vida no pó!

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Prata da Casa: "Supernova" parte 1

Ano de “sabe-se-qual”, início de século “desmerecido”, e com enorme prazer inicio esse século, mas já se passaram tantos, porém não muitos anos desde o início desse, para ser mais preciso uns tantos anos, ou seja, é ano de “onde-o-tempo-não-importa”.

Surge então um novo aluno na “escola de número 7”, sete são os pecados, escola que ficava na “Rua 10” e dez são os mandamentos.

“Rua 10” da onde?

Não sei, essa não é minha obrigação, não precisamos de tantos detalhes.

Esse aluno que vamos identificar como João, pois é um nome bem popular, há vários João no mundo e os mais religiosos dizem que João era um dos discípulos- o mais amado - de Jesus, contudo isso não é tão importante.

É apenas a popularidade do nome que chama atenção.

Maria! Meu nome é Maria, e o seu?

Passaram-se “horas” até o som da primeira palavra.

João! Meu nome é João.

Maria é bela. E não é única entre as mulheres na verdade como João, Maria é várias, essa então não é pura e nem concebida sem pecado.

É olhando para o céu que João se materializa e realiza.

Quando fecha seus olhos tudo torna sépia com efeitos de luz em preto e branco, “esse céu é baunilha pura”, pensava alto, mas para dentro de si. Ninguém escuta a imaginação, “escorrego entre chantili e pego em baunilha, levo minha mão a boca e tudo se torna um grande sorriso, é quando vejo em cena acima das nuvens e bem acima, quase não é possível enxergar aquelas espumas” Maria surge em porcelana e seu sorriso é gracioso. “Maria é minha Nossa Senhora dos Sorrisos, quando vejo tudo em sépia é ela que transcende qualquer estrela” um pensar bobeado tomava conta naquele encontro, “Maria é minha estrela, minha plantação de morangos. Morangos? Antiquado, meu mundo sempre pareceu antiquado, nada acontece a minha volta e quando acontece é por causa dos meus olhos fechados. Em meu mundo posso tudo, posso até Amar”. Ainda perdido entre a fricativa do nome de Maria, outro pensar parecia despertar: “João, será esse João o ‘amor’ que tanto sublimei no decorrer da vida?” E agora moça?

“Minha vida nunca foi fácil à vista dos olhos que nunca pertenceram a mim, sobre meus olhos fui mais que aventureira, fui desbravadora da mente humana andei sobre espaços, pisos, andei em tetos. E vejam os tetos há tempos não resistem muito, tornam-se pó a cada pedrinha de gelo que vem das lágrimas dos amores não correspondidos, onde morava toda ‘chuva de gelo’ fazia despedaçar o amor daquelas frágeis colunas, por isso logo cedo decidi encontrar-me com o pecado, por meio da necessidade, somente para saber todo o processo químico corporal,não me arrependo, será que matei o amor?”

Era um encontro, o primeiro de muitos, só não sabiam por que nada falavam, João e Maria são bem diferentes em alguns aspectos, mas...

Bem vamos entrar? O sinal indica o início da aula.

Aquele garoto que acabara de chegar ainda permanecia imóvel, parecia está procurando quadrinizar em palavras o metro quadrado de linha, quadrinizar o horizonte de pauta existente, quadrinizar as resmas oferecidas pela natureza, quadrinizar os momentos da vida. Colocar quadros em câmera lenta, de preferência, um por minuto e perceber as pegadas deixadas no solo da linha do tempo, cada metro de linha é um tempo tão efêmero que são necessários números incontáveis de carretéis para colocar mais quadros um sempre mais próximo do outro e ocupar o desgosto de um gosto de viver que não pode ser preenchido por algum motivo.

A vida para muitos não é boa, sem exageros chega a certos pontos a ser miserável. Miserável vida. Outra droga por favor.Destruíram a moldura daquele quadro. A imagem constituída, com pontos e mais pontos, de uma fração de um minucioso momento de preciosidade mofou, o tempo rasgou e o lugar na linha que ela ocupava se rompeu. Era a cena um pouco antes de o sinal tocar.

Constitui-se um nó, mais um nó na linha do tempo.

Há algum vento a favor dessas águas sem direção. Que direção se deve seguir? –Aqueles, provavelmente, da sala de aula - Não existe jangada nem salva-vidas, e a bússola existente está dentro do corpo e aponta para o sul das águas, o norte é praticamente intocável-Nesse momento Maria passa por João que agora não vê mais os olhos daquela moça, e ao virar o corpo percebe apenas o balançar... - Mergulhados nas mais diversas vontades de viver é fotografado, gravado em pedra-pome mais um fato da vida.

Conheço a dor, conhecemos, eles conhecem, e essa fique estagnada no nó que a originou, ao sentir outra dor e outro quadro tentar mofar, espero, esperamos, eles esperam, que seja o quadro que chora por uma dor, somente assim as forças se anulam.

...o balançar dos olhos até ela sentar.

João ainda está em pé perto da porta é sua vez de entrar. Lógico após Maria, sempre primeiro as damas, mesmo quando não percebe.

A primeira aula era de Matemática, não merecemos saber sobre a aula até porque ninguém ali conversava nada de muito interessante. A única direção dos olhares era para uma figura esquálida e um pedaço de concreto negro-esverdeado preenchido de números que não se referiam à quantidade de alunos em sala. É chegada à hora do intervalo todos vão aos banheiros e bebedores o tempo é curto serve mal para as necessidades fisiológicas e para os ensaios curtos de banheiros, principalmente, no feminino, enquanto no masculino os pequenos discursos da oralidade eram sempre piadas “machistas”. O machismo esse movimento histórico e cultural da humanidade vem de longas datas. Os que se dizem sábios falam que essa prática exacerbada de masculinidade vem do tempo do grande patriarca chamado Abrão, mais uma futilidade da vida conduzida pela necessidade de se mostrar homem. Então podemos chamar os ensaios curtos dos banheiros femininos de “feminismo” ao contrário do machismo não vêem assim de longa data, porém para as mulheres mais modernas é de grandessíssima relevância, talvez essa necessidade da “guerra dos sexos” faça homens e mulheres mais humanos, enfim são os sexos opostos que se acasalam isso quando os do mesmo sexo não o fazem.

Acasalar-se é da vontade humana independente de opção sexual ou de feminismos e machismos.

João não suportava essa pratica machista contra a alma feminina, não possuía essa qualidade da virilidade cultural do homem, era utópico demais tão quanto aquilo que acreditara ser verdade.

Já Maria essa tinha em suas raízes a prática do feminismo era adepta dos pequenos ensaios era necessário para a alma daquela- quem deixara João estático por alguns segundos- a busca insaciável pelo prazer nas coisas, principalmente, quando se fazia “amor” com alguém, mas para chegar ao prazer tinha que estabelecer uma lógica apenas para o subconsciente, para a libido, enfim para o subconsciente e o ego da libido, caso contrário, às ações realizadas seja para qualquer finalidade eram vazias, e ao tratar de fazer “amor” então... hummmm!!! Até porque sentir prazer não se tem muito da razão.

Fazer as coisas sem amor é algo além de vil é praticamente nada, o estranho é quem pensava assim era quem dizia que matara o amor, talvez o seu “fazer amor” fosse apenas o modo de pensar ou falar. O seu amor é sentir prazer, isso é viver. Matar o amor é uma dúvida.

Então é chegada à hora. Basta olhar. Parar e olhar tão desprezível, o vazio, a angustia gerada por conhecer esse amontoado de razões baseadas em nada. O “nada” aqui tratado não é sobre “o que ele é”, esse ainda é outra abstração originada de um vazio ainda maior.

Quando sentarmos em um sofá qualquer ou em outro lugar tão desprovido de empecilhos para o pensamento, o terror que vem a cabeça, a tão enorme cabeça o tão imenso cérebro e a gigantesca imaginação, nada mais é o mecanismo de defesa acionado. Defender-se de que? Da morte, essa que talvez seja a único medo verdadeiramente em essência do âmago humano, tanto em sua genealogia quanto em todo seu processo de formação de caráter.

Você estupidamente diz não ter medo de morrer, mas seu corpo sempre reage ao contrário frente ao perigo - Maria não tinha medo desde que seja para sentir prazer- Muito bem isso ainda não é uma verdade absoluta, até porque o que temos aqui é nada.

O ciclo da vida é uma constante paráfrase.

Saia do seu mundo e parta para outros mundos e quando voltar a seu mundo para vivê-lo de novo tudo parecerá novo, ou não?

Cômico tudo é tão cômico junto à irritabilidade de transparecer sério.

O que significa tudo isso sobreposto em palavras?

Nada!

Nada?

Maria se interessava somente pelo prazer, será isso que ela percebeu nos olhos de João no quadro que se formara naquele segundo antes da aula começar? E porque não!? É como uma fêmea selecionando seu macho para acasalar. No mundo selvagem não é macho que seleciona a fêmea? Talvez, devem existir bichos a qual processo o macho é selecionado, e tratando-se do bicho humano que diferença faz, nesse caso não há feminismos ou machismos tampouco medo e vazio.

Tocava novamente o sinal é tempo de voltar à sala, o próximo sinal seria para a despedida e assim se fez, ao sair João novamente encontra Maria em seu caminho.

Até amanhã moço é um prazer ter você em nossa sala, e pensou “ainda mais tratando...” Maria é puxada com tanta pressa que nem completará o pensamento sobre o garoto.

Porque tanta pressa Lílian? Nem deu pra despedir do garoto direito “Lílian anda estranha”, porque a pressa mesmo?

Nenhuma palavra, então é quando chega à hora das duas dizerem: Até amanhã.Um duplamente “até amanhã”.

Lílian não é um nome muito comum como João e Maria é outra máscara.

Ao chegar a casa depois daquele duplamente “até amanhã” a garota apressada que tinha puxado a amiga pelo braço, joga-se na cama e começava a pensar:

“Uma vida útil”

“Uma indecisão muito triste seria optarmos pela tristeza. Mas não sabemos curar as tristezas uns dos outros, o que fazemos ou quando fazemos é: consolar a nós mesmos através de uma experiência do próximo. Pobre aquele por não conseguir ficar triste, porque em seu primeiro momento de depreciação da vida não conseguirá fugir. E como fica quem já passou por isso tantas vezes, como fica? Não é fortemente preciso falar daquilo que não conhecemos plenamente. Quanta ‘melancolia’! Já perdemos as contas de quantas vezes usamos esta palavra: tristeza! Precisamos seriamente é respirar fundo não da para viver assim: brincar de ser feliz; pensar que tudo é ‘paz e amor’. Estamos esgotados por uma razão incomum que desencadeia um sentimento aparentemente comum. Com fins de propagar algo melhor, bom mesmo é morrer, ser corajoso. Do que vale uma vida se não aproveita-la? Forte cansaço trabalhador do dia-a-dia, mas ninguém é de ferro então o melhor a fazer é descansar por invalidez. Diga-nos, isso é justo? E por fim menor forte é o homem que morre para dentro de si e descobre em seu âmbito sentimental a mais pura alma, e consegue colocá-la em ação, esse sim soube o que é um pingo de felicidade.”

A garota não se continha e pensava mais, grande necessidade humana esta de deitar e pensar, cinco, dez minutos ou até mesmo o dia todo, de tanto pensar chegamos a esquecer de comer, muito bem, dependendo do pensamento, caso seja sobre comida talvez não esqueçamos.

Lílian essa era capaz de absorver-se na cama sem mesmo um lençol para cobrir tantas idéias aleatórias.

Neste caso utilizou tinta e folhas:

Carta número que já perdi as contas, ou carta para a pessoa amada, ou ainda carta para humanidade”

“O que mais desejo, mais do que nunca é fazer nossas esperanças nascerem nos corações desamparados, lançar você em um lago de paixões e fazer as mais belas citações de amor. Pois é isto que sinto, todos os sentimentos calorosos em seu alto grau de perfeição, gravados em algo que jamais poderá se apagar, sim, é algo indestrutível, forças que nunca irão se apagar. Não sei se é uma promessa eterna, porém é infinita.Que toda poesia e as mais belas formas que te constituem nunca se desfalquem, porque, toda à alma humana é formada por uma preciosidade. Ninguém jamais conseguiu traduzir, mas existe porque a sentimos, entende então que eu a sinto de uma forma que não consigo te explicar.Digo então: É bom, é retrógrado também, o processo retardado não importa e sim a sua solidez infinita.Exclamo então:É irreparável! É vivaz! É apaixonante! Pena que não consiga viver as cólicas e as noites de sono perdidas!Tudo isto é para amamentar o que nos resta, para emergir nossas ‘belas-flores’, nosso fogo (chama) que de alguma poder ainda vive.”

Decerto mais uma apaixonada que vivia em perturbação por não achar resposta para tudo que pensasse sempre enchia sua cabeça de “porquê”, “porque”, “por que” e por quê”...São tantos os seus “p’o’r’q’u’e’s”...assim como de tantas mulheres em sua idade. A idade tão irrelevante e transparente quanto o tempo que nada diz, as escrituras sagradas chega a dizer em um de seus livros que não se mede a experiência pelos fios dos cabelos brancos e o tempo é tão irrelevante e efêmero como o tamanho dos fios dos cabelos. Mas sua cabeça já tinha acumulado muitas reflexões, tal como Maria tinha tanta experiência vivida, outrora mais uma contrária a figura de João mesmo partilhando do mundo das idéias Lílian tinha chegado em lugares que poucos chegaram.

Inicia-se outra pintura.

Paletas, cavaletes, tintas do mais variados tipos. Qual o lado do observador e do observado, pouca é comentada a arte das massas, porque pouco se fala dos artistas do submundo, não precisamos de referências técnicas, utilizamos restos de tijolos sobre o barro, entortamos arames e construímos barracas, nós somos o observador e o observado. Não temos pontilhismo, surrealismo, cubismo, dadaísmo, ou modernos de semanas passadas. Os quadros aqui formados são sobre folhas constituídas de signos dos mais variados significados, pinceladas vazias despertadas pela fome do café da manhã que se segue.

Sonia acordou cedo neste dia, pensava em da uma volta pela “avenida do coração fechado”, mas antes queria visitar sua amiga que não atendia seus telefonemas.

Não se sabe o motivo do desaparecimento de Tânia, por meses não dava mais notícias. Sonia que certo dia acordara cedo decidira visitar a amiga. Com o passar de cada chamada de Sonia pelo nome da amiga, o tempo parecia mais calado, a “avenida do coração fechado” ficava cada vez mais fechada.

A “avenida do coração fechado”. O porquê desse nome?

A única coisa que se sabe é que ela fica perto da “encruzilhada onde os desejos se realizam”, contudo não vá pensando você que basta pensar para os desejos serem realizados é necessário morar na “encruzilhada”. Eis o azar de Sonia, morava do outro lado da “cidade dos navegantes”, em um lugar chamado “onde as pontes não se cruzam”.

Como faria Sonia para realizar seu desejo, resolver mais essa problemática da vida, caso Tânia estivesse por perto para oferecer uma pequena sugestão.

Algum tempo antes de Sonia acordar cedo no dia que decidira visitar a amiga, Tânia saíra de seu confinamento do tempo indeterminado, para tomar um pequeno vento e pegar alguns alimentos que se encontrara em um mercadinho perto de sua casa, no mesmo dia a moça pensou em uma solução para realizar seus desejos na “encruzilhada onde os desejos se realizam” sem precisar sair da “avenida do coração fechado”.

É engraçado quando temos soluções e sumimos com elas e depois nunca mais nos encontramos e ninguém também não nos encontra, parece uma espécie de intervenção divina quando as idéias surgem, entretanto, o mesmo não é ao sumirem. As intervenções divinas deveriam acontecer não quando as idéias vêem e sim quando elas decidem sumir. Tânia sumiu e nenhum deus apareceu para intervir no seu sumiço, e com isso Sonia passara a sofrer mais, pois não sabia como realizar seus desejos já que não morava naquele lugar que todos nós já sabemos.

“Dia que pouco interessa” do mês “que ninguém quer se preocupar” do ano “que um dia há de acabar”. Estamos na cidade onde tempo não interessa a única coisa que interessa nesta cidade é à força de vontade. E aqui se encontra Tânia toda realizada com seus pensamentos e perto da sua casa abandona, pois nesta cidade basta pensar para está perto de onde que se está.

Devíamos pensar mais com o coração para realizar nossos desejos, dá menos importância para o tempo, alias o tempo não é nada quando estamos perto de quem amamos.

Esta cidade fica na “avenida do coração fechado” dentro da casa de Tânia.

Quantas pinturas ficam inacabadas, outras mofam esquecidas no tempo que mal temos para sonhar. Há um processo interessante e parecido com as roupas, com o passar do tempo as costuras vão perdendo a firmeza a linhas entrelaçadas no pano hão de se desfazerem até formarem buracos isso quando os buracos não são feitos com efeitos de água e sabão, não a graça nisso tudo do que adianta as costuras serem firmes se mal servem para atar os efeitos do tempo?

Nós pintamos o tempo todo, utilizamos as mais diversas cores principalmente nos rostos, sempre estamos escondendo nossos rostos, a cor mais interessante chama-se “personalidade”, o pior: a todo o momento fazemos pinturas levantando pedaços de panos atados e hastes que mal servem para limparem os ouvidos. Não utilizamos água e sabão somente para lavarmos roupas, afinal não há algo mais saboroso do que a água que cai sobre o corpo não só para tirar a tinta do rosto, mas também para lavarmos os buracos da alma, é um processo químico social que não se pensa muito com o coração. Nesse processo o tempo é de tamanha relevância e destreza, quadros assim não têm tanta significação quanto ao primeiro quadro que se formara na “escola de número 7” da “Rua 10”, pois naquela escola, naquele momento utilizou: o corpo como espaço, as idéias como forma e as forças como ferramenta para jogar as tintas que jorraram dos corações, não havia cronômetro para viver.

Tânia no dia seguinte apareceu em sala de aula.

Sonia sorriu com tons de verde musgo.

Agora teria a sua solução.

Aula de História, ao contrário da aula de Matemática os números aqui parecem ter alguma relevância, por algum motivo não há uma disciplina chamada História da Matemática, mas os números em História servem somente para marcar o tempo...

Nosso tempo: pontos, somente pontos...

Pontos parecem formar muitas coisas desde a matéria física à espectral. Problema de Sonia: Fantasmas.

Era tarde para Sonia no dia em que “as luzes se apagaram” tudo escureceu, seus suspiros eram tentativas vãs sua alma também se apagava era uma sensação indescritível. Solidão. Alucinação. Ácido lisérgico. Paradas. Doses intermináveis de etanol. Morria uma vida dentro da vida, um útero apodrecendo. A mente desse ser não era mais dele. Nova: drogas, depressão ainda que uma vida indesejada mesmo morta desde sua concepção chutasse seu útero e uma leve preocupação com o tempo não sumia. Causa principal: Fantasmas.

Por várias, diversas e estupendas razões deixamo-nos levar pela acepção do gozo da vida, não refletimos muito sobre ela, seguimos em frente somente pelo prazer como personagens de romances e de tantos livros de ficção ou não. Por várias vezes, diversas e estupendas não-razões deixamo-nos levar pelo planejar-ações como se a vida não tivesse nada de acaso e esquecemos que podemos aproveitar o gozo e toda sensação de liberdade pela escolha. É questão de escolha viver. Há acaso. Não há acaso. Assim era Sonia.

Conhecemos essa moça, que nada sabemos a não ser de uma louca obsessão por uma amiga que também nada sabemos, em certas palavras atrás e de alguma forma aqui é o seu ponto final.

Não há mais Sonia.

Dia de “fechar-o-corpo-com-caixa” estavam todos ali reunidos, alunos, professores, João, Maria e Lílian. Começamos um caso e agora ele está morto. Tânia não estava naquele lugar cheio de flores: margaridas, lírios, rosas, orquídeas, dálias, cravos, ipês e de que rochas formavam corredores de casas cheias de pessoas adormecidas. Mais uma conseguira abrigo naquele lugar silenciado pelas lágrimas e orações. Causa: Fantasmas.

João não conhecia Sonia estava neste abrigo de santos, por pura concessão de espírito solidário que continha, mas Maria e Lílian não só trocara certas palavras como “bom dia” e “até amanhã” acompanhara o drama dessa moça desde que se entende por mundo. Próximas era um quarteto que se desfizera por demasiadas contradições.

Sabemos nós que Maria formada mulher pelas conjunções carnais desencadeadas por motivos extraconjugais de seus embrionários patológicos, teve que arrumar trabalho cedo e como nunca tivera alguma oportunidade se jogou ao jogo das tentações, nova, mas com sabedoria, pois nunca desistira de seus estudos. Sabemos nós que Lílian formada mulher pelas idéias também já conjurou seu corpo aos bens de ir contra a castidade, mas não fora por motivos à moda de Maria e sim pela curiosidade de sentir a pele na pele. Agora saberemos que Sonia teve um único momento de desprazer: violada, não suportava viver era uma criança tinha sonhos de princesas de contos de fadas, mesmo sendo apaixonada por Tânia, a violação de seu corpo custou um preço, um feto indesejado. Perdeu os pais tempo depois, sua vida não era mais vida, utilizou dos recursos químicos laboratoriais de fundo de quintal para continuar a viver, mas sua vida perdia mais vida, somado com frascos e mais frascos de etanol. Sonia via fantasmas, ouvia fantasmas. Causa: Esquizofrenia.

Tânia não agüentou a pressão. Causa: Suicídio. Sonia era tudo e Tânia seria tudo, vidas destruídas que se completariam em joio de cinzas.

Sobre Tânia saberemos nós que era uma mulher que perdera um amor não realizado e isso basta, pois aqui se encerra duas vidas, enquanto a solução de Tânia? Era Sonia e de Sonia era Tânia. Mas a vida para aquela que fora violada fora além do tempo que conseguimos imaginar para crer em soluções e sobre sua vida a acidez não deixou marcas do tempo apenas a destruiu.

Não há mais “avenida do coração fechado”, “encruzilhada onde os desejos se realizam” ou “cidade dos navegantes”. Agora ambas são somente uma.

Tânia futuro sal da terra foi-se com a certeza de que bastava pensar mais com o coração para realizar nossos desejos, dá menos importância para o tempo, alias o tempo não é nada quando estamos perto de quem amamos. Sonia amou Tânia. Tânia amou Sonia.

Lílian pensava cada dia mais pensava sobre a tristeza. Depois da morte das amigas suas reflexões eram constantes. Lembrava dos sorrisos de ambas, passou um “dia qualquer” nos túmulos que ficavam um do lado do outro e deixou um papel e lá estava: “... nosso fogo (chama) que de alguma poder ainda vive.” Era sua despedida para/de ambas.

Lílian não é um nome muito comum como João e Maria é outra máscara.

Ao chegar a casa depois daquele duplamente “até amanhã” a garota apressada que tinha puxado a amiga pelo braço, joga-se na cama e começava a pensar:

“Uma vida útil”

“Uma indecisão muito triste seria optarmos pela tristeza. Mas não sabemos curar as tristezas uns dos outros, o que fazemos ou quando fazemos é: consolar a nós mesmos através de uma experiência do próximo. Pobre aquele por não conseguir ficar triste, porque em seu primeiro momento de depreciação da vida não conseguirá fugir. E como fica quem já passou por isso tantas vezes, como fica? Não é fortemente preciso falar daquilo que não conhecemos plenamente. Quanta ‘melancolia’! Já perdemos as contas de quantas vezes usamos esta palavra: tristeza! Precisamos seriamente é respirar fundo não da para viver assim: brincar de ser feliz; pensar que tudo é ‘paz e amor’. Estamos esgotados por uma razão incomum que desencadeia um sentimento aparentemente comum. Com fins de propagar algo melhor, bom mesmo é morrer, ser corajoso. Do que vale uma vida se não aproveita-la? Forte cansaço trabalhador do dia-a-dia, mas ninguém é de ferro então o melhor a fazer é descansar por invalidez. Diga-nos, isso é justo? E por fim menor forte é o homem que morre para dentro de si e descobre em seu âmbito sentimental a mais pura alma, e consegue colocá-la em ação, esse sim soube o que é um pingo de felicidade.”

A garota não se continha e pensava mais, grande necessidade humana esta de deitar e pensar, cinco, dez minutos ou até mesmo o dia todo, de tanto pensar chegamos a esquecer de comer, muito bem, dependendo do pensamento, caso seja sobre comida talvez não esqueçamos.

Lílian essa era capaz de absorver-se na cama sem mesmo um lençol para cobrir tantas idéias aleatórias.

Neste caso utilizou tinta e folhas:

Carta número que já perdi as contas, ou carta para a pessoa amada, ou ainda carta para humanidade”

“O que mais desejo, mais do que nunca é fazer nossas esperanças nascerem nos corações desamparados, lançar você em um lago de paixões e fazer as mais belas citações de amor. Pois é isto que sinto, todos os sentimentos calorosos em seu alto grau de perfeição, gravados em algo que jamais poderá se apagar, sim, é algo indestrutível, forças que nunca irão se apagar. Não sei se é uma promessa eterna, porém é infinita.Que toda poesia e as mais belas formas que te constituem nunca se desfalquem, porque, toda à alma humana é formada por uma preciosidade. Ninguém jamais conseguiu traduzir, mas existe porque a sentimos, entende então que eu a sinto de uma forma que não consigo te explicar.Digo então: É bom, é retrógrado também, o processo retardado não importa e sim a sua solidez infinita.Exclamo então:É irreparável! É vivaz! É apaixonante! Pena que não consiga viver as cólicas e as noites de sono perdidas!Tudo isto é para amamentar o que nos resta, para emergir nossas ‘belas-flores’, nosso fogo (chama) que de alguma poder ainda vive.”

Decerto mais uma apaixonada que vivia em perturbação por não achar resposta para tudo que pensasse sempre enchia sua cabeça de “porquê”, “porque”, “por que” e por quê”...São tantos os seus “p’o’r’q’u’e’s”...assim como de tantas mulheres em sua idade. A idade tão irrelevante e transparente quanto o tempo que nada diz, as escrituras sagradas chega a dizer em um de seus livros que não se mede a experiência pelos fios dos cabelos brancos e o tempo é tão irrelevante e efêmero como o tamanho dos fios dos cabelos. Mas sua cabeça já tinha acumulado muitas reflexões, tal como Maria tinha tanta experiência vivida, outrora mais uma contrária a figura de João mesmo partilhando do mundo das idéias Lílian tinha chegado em lugares que poucos chegaram.

Inicia-se outra pintura.

Paletas, cavaletes, tintas do mais variados tipos. Qual o lado do observador e do observado, pouca é comentada a arte das massas, porque pouco se fala dos artistas do submundo, não precisamos de referências técnicas, utilizamos restos de tijolos sobre o barro, entortamos arames e construímos barracas, nós somos o observador e o observado. Não temos pontilhismo, surrealismo, cubismo, dadaísmo, ou modernos de semanas passadas. Os quadros aqui formados são sobre folhas constituídas de signos dos mais variados significados, pinceladas vazias despertadas pela fome do café da manhã que se segue.

Sonia acordou cedo neste dia, pensava em da uma volta pela “avenida do coração fechado”, mas antes queria visitar sua amiga que não atendia seus telefonemas.

Não se sabe o motivo do desaparecimento de Tânia, por meses não dava mais notícias. Sonia que certo dia acordara cedo decidira visitar a amiga. Com o passar de cada chamada de Sonia pelo nome da amiga, o tempo parecia mais calado, a “avenida do coração fechado” ficava cada vez mais fechada.

A “avenida do coração fechado”. O porquê desse nome?

A única coisa que se sabe é que ela fica perto da “encruzilhada onde os desejos se realizam”, contudo não vá pensando você que basta pensar para os desejos serem realizados é necessário morar na “encruzilhada”. Eis o azar de Sonia, morava do outro lado da “cidade dos navegantes”, em um lugar chamado “onde as pontes não se cruzam”.

Como faria Sonia para realizar seu desejo, resolver mais essa problemática da vida, caso Tânia estivesse por perto para oferecer uma pequena sugestão.

Algum tempo antes de Sonia acordar cedo no dia que decidira visitar a amiga, Tânia saíra de seu confinamento do tempo indeterminado, para tomar um pequeno vento e pegar alguns alimentos que se encontrara em um mercadinho perto de sua casa, no mesmo dia a moça pensou em uma solução para realizar seus desejos na “encruzilhada onde os desejos se realizam” sem precisar sair da “avenida do coração fechado”.

É engraçado quando temos soluções e sumimos com elas e depois nunca mais nos encontramos e ninguém também não nos encontra, parece uma espécie de intervenção divina quando as idéias surgem, entretanto, o mesmo não é ao sumirem. As intervenções divinas deveriam acontecer não quando as idéias vêem e sim quando elas decidem sumir. Tânia sumiu e nenhum deus apareceu para intervir no seu sumiço, e com isso Sonia passara a sofrer mais, pois não sabia como realizar seus desejos já que não morava naquele lugar que todos nós já sabemos.

“Dia que pouco interessa” do mês “que ninguém quer se preocupar” do ano “que um dia há de acabar”. Estamos na cidade onde tempo não interessa a única coisa que interessa nesta cidade é à força de vontade. E aqui se encontra Tânia toda realizada com seus pensamentos e perto da sua casa abandona, pois nesta cidade basta pensar para está perto de onde que se está.

Devíamos pensar mais com o coração para realizar nossos desejos, dá menos importância para o tempo, alias o tempo não é nada quando estamos perto de quem amamos.

Esta cidade fica na “avenida do coração fechado” dentro da casa de Tânia.

Quantas pinturas ficam inacabadas, outras mofam esquecidas no tempo que mal temos para sonhar. Há um processo interessante e parecido com as roupas, com o passar do tempo as costuras vão perdendo a firmeza a linhas entrelaçadas no pano hão de se desfazerem até formarem buracos isso quando os buracos não são feitos com efeitos de água e sabão, não a graça nisso tudo do que adianta as costuras serem firmes se mal servem para atar os efeitos do tempo?

Nós pintamos o tempo todo, utilizamos as mais diversas cores principalmente nos rostos, sempre estamos escondendo nossos rostos, a cor mais interessante chama-se “personalidade”, o pior: a todo o momento fazemos pinturas levantando pedaços de panos atados e hastes que mal servem para limparem os ouvidos. Não utilizamos água e sabão somente para lavarmos roupas, afinal não há algo mais saboroso do que a água que cai sobre o corpo não só para tirar a tinta do rosto, mas também para lavarmos os buracos da alma, é um processo químico social que não se pensa muito com o coração. Nesse processo o tempo é de tamanha relevância e destreza, quadros assim não têm tanta significação quanto ao primeiro quadro que se formara na “escola de número 7” da “Rua 10”, pois naquela escola, naquele momento utilizou: o corpo como espaço, as idéias como forma e as forças como ferramenta para jogar as tintas que jorraram dos corações, não havia cronômetro para viver.

Tânia no dia seguinte apareceu em sala de aula.

Sonia sorriu com tons de verde musgo.

Agora teria a sua solução.

Aula de História, ao contrário da aula de Matemática os números aqui parecem ter alguma relevância, por algum motivo não há uma disciplina chamada História da Matemática, mas os números em História servem somente para marcar o tempo...

Nosso tempo: pontos, somente pontos...

Pontos parecem formar muitas coisas desde a matéria física à espectral. Problema de Sonia: Fantasmas.

Era tarde para Sonia no dia em que “as luzes se apagaram” tudo escureceu, seus suspiros eram tentativas vãs sua alma também se apagava era uma sensação indescritível. Solidão. Alucinação. Ácido lisérgico. Paradas. Doses intermináveis de etanol. Morria uma vida dentro da vida, um útero apodrecendo. A mente desse ser não era mais dele. Nova: drogas, depressão ainda que uma vida indesejada mesmo morta desde sua concepção chutasse seu útero e uma leve preocupação com o tempo não sumia. Causa principal: Fantasmas.

Por várias, diversas e estupendas razões deixamo-nos levar pela acepção do gozo da vida, não refletimos muito sobre ela, seguimos em frente somente pelo prazer como personagens de romances e de tantos livros de ficção ou não. Por várias vezes, diversas e estupendas não-razões deixamo-nos levar pelo planejar-ações como se a vida não tivesse nada de acaso e esquecemos que podemos aproveitar o gozo e toda sensação de liberdade pela escolha. É questão de escolha viver. Há acaso. Não há acaso. Assim era Sonia.

Conhecemos essa moça, que nada sabemos a não ser de uma louca obsessão por uma amiga que também nada sabemos, em certas palavras atrás e de alguma forma aqui é o seu ponto final.

Não há mais Sonia.

Dia de “fechar-o-corpo-com-caixa” estavam todos ali reunidos, alunos, professores, João, Maria e Lílian. Começamos um caso e agora ele está morto. Tânia não estava naquele lugar cheio de flores: margaridas, lírios, rosas, orquídeas, dálias, cravos, ipês e de que rochas formavam corredores de casas cheias de pessoas adormecidas. Mais uma conseguira abrigo naquele lugar silenciado pelas lágrimas e orações. Causa: Fantasmas.

João não conhecia Sonia estava neste abrigo de santos, por pura concessão de espírito solidário que continha, mas Maria e Lílian não só trocara certas palavras como “bom dia” e “até amanhã” acompanhara o drama dessa moça desde que se entende por mundo. Próximas era um quarteto que se desfizera por demasiadas contradições.

Sabemos nós que Maria formada mulher pelas conjunções carnais desencadeadas por motivos extraconjugais de seus embrionários patológicos, teve que arrumar trabalho cedo e como nunca tivera alguma oportunidade se jogou ao jogo das tentações, nova, mas com sabedoria, pois nunca desistira de seus estudos. Sabemos nós que Lílian formada mulher pelas idéias também já conjurou seu corpo aos bens de ir contra a castidade, mas não fora por motivos à moda de Maria e sim pela curiosidade de sentir a pele na pele. Agora saberemos que Sonia teve um único momento de desprazer: violada, não suportava viver era uma criança tinha sonhos de princesas de contos de fadas, mesmo sendo apaixonada por Tânia, a violação de seu corpo custou um preço, um feto indesejado. Perdeu os pais tempo depois, sua vida não era mais vida, utilizou dos recursos químicos laboratoriais de fundo de quintal para continuar a viver, mas sua vida perdia mais vida, somado com fracos e mais fracos de etanol. Sonia via fantasmas, ouvia fantasmas. Causa: Esquizofrenia.

Tânia não agüentou a pressão. Causa: Suicídio. Sonia era tudo e Tânia seria tudo, vidas destruídas que se completariam em joio de cinzas.

Sobre Tânia saberemos nós que era uma mulher que perdera um amor não realizado e isso basta, pois aqui se encerra duas vidas, enquanto a solução de Tânia? Era Sonia e de Sonia era Tânia. Mas a vida para aquela que fora violada fora além do tempo que conseguimos imaginar para crer em soluções e sobre sua vida a acidez não deixou marcas do tempo apenas a destruiu.

Não há mais “avenida do coração fechado”, “encruzilhada onde os desejos se realizam” ou “cidade dos navegantes”. Agora ambas são somente uma.

Tânia futuro sal da terra foi-se com a certeza de que bastava pensar mais com o coração para realizar nossos desejos, dá menos importância para o tempo, alias o tempo não é nada quando estamos perto de quem amamos. Sonia amou Tânia. Tânia amou Sonia.

Lílian pensava cada dia mais pensava sobre a tristeza de depois da morte das amigas suas reflexões eram constantes. Lembrava dos sorrisos de ambas, passou um “dia qualquer” nos túmulos que ficavam um do lado do outro e deixou um papel e lá estava: “... nosso fogo (chama) que de alguma poder ainda vive.” Era sua despedida para/de ambas.





continua...